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Maria Francelina Trenes e o APERS no Podcast “Para Marias”: combate à violência contra as mulheres em pauta

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Na imagem, detalhe da folha 22, onde começa o depoimento da 1ª testemunha. Todas as testemunhas ouvidas ao longo do processo, assim como os operadores da justiça, eram homens.
Todos os operadores da Justiça e todas as testemunhas ouvidas ao longo do processo eram homens.
Por Clarissa Sommer/ APERS

Embora na área de arquivos nós façamos sempre o movimento de destacar as relações orgânicas entre os itens de um acervo, demonstrando que eles precisam ser considerados e analisados em seu contexto de produção, é inegável que alguns documentos ganham lugar especial entre o público e até mesmo no imaginário social. No Arquivo Público do RS temos um processo judicial que certamente faz parte desse rol de documentos que aguçam a curiosidade e evocam relações de pertencimento: o processo criminal associado à lendária história de “Maria Degolada”, bastante conhecida especialmente entre os porto-alegrenses.

Mas afinal, que documento é este? Quem são as pessoas que protagonizaram o acontecimento ali narrado? Qual a conexão entre lenda urbana, narrativas populares e registro documental enquanto prova do transcurso de um acontecimento real?

Folha 21 verso e 22

Em setembro deste ano a servidora Clarissa Sommer participou da gravação de um episódio do podcast “Para Marias”, produzido por estudantes de Jornalismo da PUC-RS, sobre a história de Maria Francelina Trenes, conhecida como “Maria Degolada”. Em 1899 ela foi brutalmente assassinada por Bruno Soares Bicudo, soldado da Brigada Militar, após uma briga travada durante uma confraternização entre amigos. O assassino, preso em flagrante, foi condenado “à 30 annos de prisão cellular” e confinado na antiga Casa de Correção de Porto Alegre. Tudo ficou registrado no processo criminal de número 1.990, da Comarca de Porto Alegre, muitas vezes referenciado pela comunidade e amplamente empregado no Arquivo em ações educativas e culturais.

Caso ocorresse na atualidade, não haveria dúvidas de que esse foi um crime motivado por violência de gênero. Uma mulher sendo morta por ser mulher, como tantas “Marias e Clarices” cujas memórias precisam ser cotidianamente reivindicadas na luta pelo fim de uma cultura machista e patriarcal, que justifica e reproduz a posse masculina, as hierarquias de gênero e a submissão das mulheres.

Recibo do réu na Casa de Correção de Porto Alegre

Desde 2015 está em vigor a Lei 13.104 de 2015, que prevê circunstância qualificadora do crime de homicídio e inclui o feminicídio no rol dos crimes hediondos. Maria Francelina foi degolada em público. O crime ocorreu poucos anos após a chamada Revolução Federalista, um sangrento conflito vivenciado no estado do Rio Grande do Sul, marcado pelos “crimes de degola” que se tornaram um terror entre a população. Certamente seu assassinato foi um crime hediondo, sobre o qual a notícia se espalhou como rastilho de pólvora e foi sendo significada, apropriada e reapropriada: em alguns momentos mais próxima da narrativa registrada no processo criminal salvaguardado pelo APERS; em outras circunstâncias, conectando-se com mazelas e anseios socialmente arraigados. Assim, Maria passou a condensar múltiplas representações do ser mulher em nosso mundo: amásia, mulher da vida, vítima, espectro, santa...

Este caso chamou a atenção da equipe do Projeto “Para Marias”, e serviu a eles como impulsionador de reflexões que estão sendo levadas para o podcast, afinal, como o grupo mesmo caracteriza: “Mulheres morrem por serem mulheres. ‘Para Marias - nunca foi amor’ é um podcast de informações e soluções para Marias que buscam alternativas de denunciar e reportar casos de violência contra a mulher”.

Mais do que trazer detalhes sobre o que é narrado entre as linhas do processo – o que você pode descobrir acessando-o em nossa Sala de Pesquisa! – pretendemos incentivá-lo a escutar o episódio em questão, a pensar sobre como podemos colaborar para a desconstrução dessa cultura de violência e sobre como os acervos das instituições arquivísticas podem ser ricos, tanto à produção de narrativas históricas quanto para a reflexão sobre os temas sensíveis de nosso tempo presente.

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Para acessar o episódio no Spotify, clique aqui. Acesse, ouça, compartilhe!

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Mais uma vez agrademos à equipe de estudantes da PUC-RS pela oportunidade de difundir o APERS e seu acervo. Vida longa a este importante projeto!

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