Café da tarde com o APERS lança livro sobre o Príncipe Custódio
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Na última terça-feira (20) o Arquivo Público promoveu mais um Café da Tarde com o APERS, espaço de debates aberto a diferentes temas do saber científico, especialmente da Arquivística e da História.
Esta edição teve como tema o lançamento do livro No refluxo dos retornados Custódio Joaquim de Almeida, o príncipe africano de Porto Alegre, com a participação dos dois autores - Jovani de Souza Scherer1 e Rodrigo de Azevedo Weimer2. A mediação foi de Caroline Acco Baseggio, historiadora do APERS. O debate ocorreu por live do Facebook, pela situação pandêmica.
Rodrigo Weimer, ao abrir a apresentação, salientou a relevância do príncipe Custódio Joaquim de Almeida, uma figura que é tão destacada e, ao mesmo tempo, tão lacunar. “Custódio Joaquim de Almeida é um símbolo da comunidade negra porto alegrense, um símbolo de dignidade e de altivez”, salienta Rodrigo. “É tido como um mediador entre as comunidades negras pobres e as elites políticas estaduais na virada do século XIX e do século XX, sendo um ícone de empoderamento negro e da origem do batuque”.

A parceria intelectual entre os autores surgiu do incômodo sobre a eventual inexistência de documentos sobre o príncipe. Buscas no APERS retornaram três novos documentos: uma sumária criminal (1885), um processo de habeas corpus (1886) e a cobrança judicial de uma dívida (1892). Pesquisas no acervo da Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional agregaram outros documentos. E Rodrigo Weimer questiona: por que publicar estes documentos? “Porque eles são patrimônio da sociedade gaúcha e, principalmente, da comunidade negra”, afirma.
O livro, uma publicação do Arquivo Público do Estado do Rio Grande do Sul, órgão da Secretaria de Planejamento, Governança e Gestão, venceu distâncias e foi produzido praticamente durante a pandemia. Está estruturado em quatro capítulos. No primeiro, os autores revisam a história já conhecida do príncipe Custódio Joaquim de Almeida e tecem, entre outras, correlações com sua chegada ao Brasil e Porto Alegre, a afrorreligiosidade e com as questões políticas da época. Na sequência, são reproduzidos documentos de processos judiciais, textos de periódicos e obituários.

Já Jovani Scherer focou sua apresentação no contexto africano do príncipe Custódio, resgatando sua história familiar e a importância do seu pai, Joaquim de Almeida, homem muito poderoso e rico, na região que, na época, era conhecida como Golfo do Benin, e que atualmente compreende principalmente Togo, Benin e Nigéria. O pai do Custódio foi escravizado, tornou-se o braço direito do comerciante de escravos Manoel Joaquim de Almeida, dele herdou o nome Joaquim de Almeida e, cerca de dez anos depois, já liberto e retornado à África, mais especificamente ao Daomé, começou a construir sua própria fortuna como capitão de navios escravistas.
Elucidando questões e trazendo outras, que os autores pretendem seguir pesquisando, Jovani Scherer pontua que “se ainda não sabemos, exatamente, os motivos que trouxeram Custódio ao Brasil, nem a data quando isto ocorreu, tampouco o local por onde desembarcou, podemos apontar, entretanto, que uma possível motivação para a sua saída de Ajudá teria sido de ordem político-religiosa. O culto de Sapatá era percebido como uma ameaça ao poder da monarquia daomeana”. Sapatá, no batuque gaúcho, equivale ao orixá Xapanã, e a ele o Príncipe foi devoto durante toda sua vida. Custódio tinha apenas uns cinco anos quando seu pai foi envenenado e as propriedades da família começaram a ser atacadas. “Gostaríamos de deixar um contexto mais delineado dessas hipóteses, mas acreditamos que também é um convite para a leitura do livro”, finaliza o autor.
Sobre os autores:
- Jovani de Souza Scherer é licenciado em História (UFRGS) e mestre em História (Unisinos). É professor do Colégio Anchieta e da Prefeitura Municipal de Porto Alegre. Tem experiência em pesquisas em História, com ênfase em fontes primárias do poder judiciário. É pesquisador do século XIX, história do Brasil Império, atuando, principalmente, nos temas alforrias, liberdade e escravidão de africanos no Rio Grande do Sul.
- Rodrigo de Azevedo Weimer – é licenciado e bacharel em História (UFRGS), mestre em História (Unisinos) e doutor em História (UFF). Cursou estágio-sanduíche na École des Hautes Études en Sciences Sociales e estágio pós-doutoral na Unisinos. É historiador do APERS e professor colaborador no programa dePós-Graduação em História da UFRGS. Seus interesses de pesquisa direcionam-se para história do pós-abolição, história LGBTQIA+, história oral e memória.